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O Cemitério de Praga: A história erguida em pilares de areia


Autor: Umberto Eco
Editora: Gradiva
Ano: 2010
Páginas: 480
Nota: 4/5
Sinopse: Durante o século XIX, entre Turim, Palermo e Paris, encontramos uma satanista histérica, um abade que morre duas vezes, alguns cadáveres num esgoto parisiense, um garibaldino que se chamava Ippolito Nievo, desaparecido no mar nas proximidades do Stromboli, o falso bordereau de Dreyfus para a embaixada alemã, o aumento gradual daquela falsificação conhecida como Os Protocolos dos Sábios Anciãos de Sião, que inspirará a Hitler os campos de extermínio, jesuítas que tramam contra os maçons, maçons, carbonários e mazzinianos que estrangulam os padres com as suas próprias tripas, um Garibaldi artrítico com as pernas tortas, os planos dos serviços secretos piemonteses, franceses, prussianos e russos, os massacres numa Paris da Comuna em que se comem os ratos, golpes de punhal, horrendas e fétidas reuniões por parte de criminosos que entre os vapores do absinto planeiam explosões e revoltas de rua, barbas falsas, falsos notários, testamentos enganosos, irmandades diabólicas e missas negras.
Mais conhecido pelo notório romance O Nome da Rosa, Umberco Eco surge mais uma vez para atordoar nossos sentidos do que realmente são os fatos históricos.

Ainda nas primeiras páginas do livro, senti a necessidade de pesquisar algumas resenhas sobre o enredo, algo que geralmente não costumo fazer, contudo o assunto abordado na sinopse parecia divergir muito com o que eu estava lendo e imaginei que um esclarecimento maior cairia bem. Acabei me deparando com diversos pontos positivos e negativos sobre a obra – o que não vem a ser uma surpresa – mas algo parecia ser de senso comum: leitura contraindicada para aqueles afeitos aos enredos de fácil mastigação típicos de Best-sellers. Calma, não estou estabelecendo nenhum estereótipo em relação aos livros que aparecem sempre na lista de mais vendidos, porém, digamos que, se você está procurando por uma leitura suave somente com o intuito de distrair-se, talvez O Cemitério de Praga não seja uma boa escolha.

Mas agora, ao livro.


Com uma trama atordoante que segue através de anos repletos de revoltas e revoluções, o livro é o conjunto de passagens do diário de Simonini – curiosamente o único personagem fictício da obra – um falsificador de documentos. Não, talvez esse não seja o termo correto para ele. Um moldador e construtor de fatos.

Atordoado, o protagonista reconstitui os eventos que o levaram a acordar com diversas lacunas na memória e os pertences de um abade em seus aposentos. Poucas páginas adiante, descobre-se de sua dupla-personalidade e, entre os registros desses dois caracteres que são, na verdade, a mesma pessoa, porém um sem consciência do outro, a história é contada e eventualmente interrompida pelo narrador.  Confuso? Sem dúvida. Nas primeiras páginas, o leitor talvez venha a encontrar dificuldade em situar-se no meio daquelas recordações, contudo no decorrer da trama, tudo torna-se tão entrelaçado que largar o livro sem descobrir o final passa a ser um ato impensável.

Contando com personalidades como Dr. Freud, Garibaldi entre outros notáveis, o grande legado do livro é a dúvida. A história que conhecemos e estudamos na escola é baseada em documentos meticulosamente analisados ao longo dos anos e, a partir de então, moldam nossa instrução. O Cemitério de Praga propõe um pequeno e significativo “mas” em tal conceito. Mas e se a verdade fosse somente uma mentira contada várias e várias vezes?

Documentos podem ser forjados e guerras inteiras são tramadas graças aos escritos contidos em uma folha de papel. E esse é ponto crucial do livro: a falsificação do Protocolo dos Sábios de Sião, registro que viria a influenciar Adolf Hitler em sua obra Mein Kampf e, posteriormente, na criação dos campos de concentração da Segunda Guerra Mundial.

Ideologias e crenças erguidas em pilares falsos. A História é escrita pelos vencedores, já dizia o ditado, e pode ser adaptada de acordo com quem possui o poder da palavra.

Trazendo a grande conspiração de O Cemitério de Praga para a era digital onde as informações atravessam o globo em questão de segundos, a pergunta implícita no livro é instigante: podemos confiar em tudo que nos é dito? Como saber filtrar o conhecimento que já chega completamente digerido e interpretado nas telas de nossos computadores e celulares?   
Alguém já não disse que o filósofo é aquele que não olha o palco, mas sim a plateia?

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