Personagens
desajustados nos causam um inegável fascínio. Sujeitos em descompasso com o
mundo que os cerca, seja nas páginas de um livro ou na tela do cinema, nos
chamam a atenção pela relação de proximidade que nos causam. Quando o indivíduo
com as características em questão é um adolescente adentrando o colegial, então
nossa identificação e empatia são quase instantâneas. O garoto Charlie,
protagonista do livro e homônimo filme As Vantagens de Ser Invisível, é o exemplo completo desta
sentença.
Tímido, quieto e
introspectivo, Charlie preserva o estereótipo do garoto problemático, que
carrega consigo uma bagagem de tragédias pessoais que refletem fatalmente na
sua personalidade. E por falar em estereótipos, As Vantagens de Ser Invisível,
de Stephen Chbosky, é um amálgama de todos os conhecidos clichês
do High School norte americano. Desde a caracterização dos personagens à suas funções e
arcos na trama. A história de Chbosky não dispensa o novato desajustado, o
melhor amigo gay do novato desajustado, os formandos valentões que praticam
bullyng e o amor à primeira vista com a garota popular do colégio, só para
citar alguns exemplos.
Tantos clichês, portanto, jamais prejudicam a qualidade de
As
Vantagens de Ser Invisível. Pelo contrário, é exatamente nos lugares-comuns que
está toda a força do livro e filme de Chbosky. Sim. Para quem desconhece, o
autor americano é responsável também pelo roteiro e direção da adaptação ao
cinema de sua obra, lançada em 2012. Dito isso, é possível afirmar que esta é uma
das mais honestas histórias já feitas sobre a adolescência desde O Apanhador no Campo de Centeio.
Honestidade essa que está
explicitada na forma como Chbosky entende o universo de seus personagens,
especialmente o de Charlie, e na destreza como estrutura as relações de amor e
ódio numa trama sobre jovens à flor da pele. Em outras palavras, a sua obra transmite
exatamente ao leitor ou espectador emoções e desafios reais da idade de seus
protagonistas.
O efeito disso é a
imediata assimilação do seu público, seja ele de qualquer idade, partindo do
princípio de que todo adulto já foi um dia um adolescente no colegial. Sabemos
como é o universo escolar, e identificamos facilmente o papel desempenhado por
cada personagem inserido nele. O colegial é um celeiro de estereótipos, cada um
de nós, afinal, um dia representamos um desses papéis.
O papel de Charlie, ainda que caiba à parcela mínima da população de uma classe (o desajustado é geralmente uma figura única e solitária) é o tipo que nos causa mais empatia. Talvez porque a introspecção de um personagem invadida e descrita pelo autor
em suas nuances nos forneça a oportunidade de olharmos para nós mesmos.
Observamos naquele indivíduo nossas próprias qualidades e fraquezas, de forma
que dificilmente observaríamos no sujeito unilateral e relativamente vazio, a
exemplo dos fortões do time de beisebol.
É na insegurança de personagens
como Charlie que a literatura e o cinema encontram o seu típico herói
desajustado, entregando-lhes as agruras da vida para lhes presentear, em algum
momento do enredo, com uma virada de jogo, momento em que irá conquistar um de
seus objetivos. No caso de Charlie, ser notado pela garota que aprende amar e
fazer boas amizades. No entanto, tal reviravolta, constante nesse tipo de trama,
só é plausível se o personagem não abdicar de sua personalidade para conseguir
um lugar ao Sol.
Em As Vantagens de
Ser Invisível existe a ameaça de que o herói esquisito que tanto adoramos, em qualquer história, seja
corrompido pelo ambiente que perigosamente passa a circular (festas privadas regadas
a álcool e drogas e bailes de formatura), se tornando mais um sujeito normal. Mas isto nunca acontece de fato. Charlie nunca deixa de ser o esquisito, e isso
lhe promove ao status de popular justamente pela sua peculiaridade e distinção,
embora o garoto não tire muitas vantagens disso.
As Vantagens de Ser
Invisível vale-se de uma trama com clichês bem definidos para tratar temas recorrentes
e complexos, como morte, homossexualidade, abuso infantil e bullyng. Stephen Chbosky deixou como legado uma obra obrigatória para
entender e refletir a adolescência, esta fase da vida que, como defende
Charlie, sabemos que vai passar enquanto estamos vivendo, e talvez por isso a
vivamos tão intensamente.
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