A Morte e A Morte de Quincas Berro D'Água – Um grito de liberdade

Autor: Jorge Amado
Editora: Record Ano: 1998 (original de 1959)
Páginas: 96
Nota: 5/5

Sinopse: O respeitável Joaquim Soares da Cunha, funcionário exemplar da Mesa de Rendas Estadual da Bahia, rompe com a família e as convenções sociais para viver aventuras no porto e na zona do meretrício de Salvador. Agora se chama Quincas Berro D'Água.

O célebre escritor Vinícius de Morais gostou tanto desse livro que o considerou que “representa dentro da novelística brasileira, onde já há cimos consideráveis, um cume máximo. Um cume que todos os escritores jovens devem ter em mira numa sadia inveja e num saudável desejo de ultrapassá-lo. E tanto pior se o não fizerem”. Entre tantas novelas excelentes, de autores de renome na Literatura Nacional, o que esta possui que chamou a atenção do poeta?



A história é simples, basicamente narra a história de Joaquim Soares, um funcionário público aposentado que havia largado a família depois que se aposentou e se tornou “Quincas Berro D'Água” que vivia na esbórnia desde então, um dia esse homem é encontrado morto. Quando sua família está fazendo o velório, os amigos bêbados acham que está vivo, apenas pregando uma peça, o levam para um passeio na cidade e lá ele interage com várias pessoas, até que numa confusão durante um passeio em um barco o corpo cai no mar e várias pessoas juram ouvir uma frase: “cada um que cuide de seu enterro, impossível não há”.

Como se pode notar, não parece ser uma história espetacular para chamar tanto a atenção de Vinícius, personagem de renome da Literatura Brasileira, o que justifica então ele considerar ela tão boa a ponto de superar as novelas de grandes vultos da época como Machado de Assis e Guimarães Rosa, o que há de diferente e impressionante na história de Quincas?

Para responder a essa questão, primeiro é preciso entender a época em que foi escrita, o mundo passou por grandes mudanças a partir da década de 1950. Televisão, liberação feminina, eletrodomésticos novos, telecomunicações muito rápidas, urbanização maciça... Todo esse novo mundo estará vinculado à nova cultura de massa, não com a cultura letrada nem com a cultura popular. A Literatura da época passou a atingir um público maior, as pessoas passaram a contestar as regras sociais impostas, as modas importadas da Europa e as famílias que viviam de aparências – a sociedade se modernizou em todos os sentidos (não é atoa que o período é conhecido como “Modernismo”).

E a história de Quincas Berro D'Água é uma analogia disso tudo: ele era um marido submisso, até nas fotos ficava encolhido perante a imagem dura da esposa, cumpria todas as obrigações no trabalho e era uma pessoa reservada, sem opiniões divergentes e que fazia tudo que era esperado dele. Ele não rompeu com a família para ser um bêbado qualquer do cais de Salvador, ele o fez para ser um homem livre, para poder fazer o que desse vontade à hora que quisesse e sem prestar contas a ninguém. Essa liberdade veio após ter sentido que concluiu com suas obrigações, afinal a única filha já era adulta e estava casada, e já havia se aposentado – ninguém mais dependia dele para viver.

A família que sempre o subjugou, evidentemente, não viu com bons olhos essa libertação e tentou de todas formas prendê-lo de novo às convenções sociais, quando Quincas finalmente morreu, eles pensaram que finalmente poderiam controlar seu destino e enterrá-lo como o cidadão de respeito que ele sempre tinha sido, só que esse cidadão que queriam enterrar era o Joaquim, o corpo limpo e arrumado que estava no caixão era dele, o Quincas não se sujeitou a esse papel nem na hora da morte, e por isso ele fugiu de novo com os amigos e foi viver sua última aventura e se despedir com a aventura e o sacarmos com que sempre viveu.